André Murtinho Ribeiro Chaves
Descendente
de indígenas das etnias Bororo, MT e Kariri-Xocó, AL/SE
Como você se sentiria se
invadissem o seu país, sua cidade, sua casa? Como se sentiria ainda se durante
muitos anos este território fosse ocupado por estes invasores? E como se
sentiria se, após anos acuados, os verdadeiros donos da terra decidissem
retomar suas casas, seu território? Pense um pouco mais na história e nos
direitos conquistados pela população mais pobre, vença o preconceito e
reconheça o grito: “esta terra é nossa e ninguém tira!”.
Sempre que defendemos os
direitos indígenas, quilombolas, caiçaras, ribeirinhos, sem-terras, sem-tetos e
favelados, surgem vozes preconceituosas (e certamente ignorantes) atacando
estes povos, como se os violentos fossem eles ou mesmo como se ser miserável
fosse uma opção, chamando de “mendigos”, “sujos”, “vagabundos”, “pedintes”,
“alcóolatras”, entre outras barbaridades.
Por incrível que pareça,
o mais contraditório e incoerente, em relação aos indígenas, é a acusação de
que “índio que sabe falar e que tem celular já não é mais índio”, ignorando um
dos aspectos mais importantes da sociedade que é a miscigenação cultural. O
fato de incorporar aspectos de outras culturas não significa, nem é o
suficiente para negar a sua. Neste ponto, perguntamos: se acham ruim o indígena
estar mendigando ou mesmo se acham péssimo indígenas incorporarem outras
culturas, o que querem para nossos povos originários? O extermínio?
Certamente, muitos destes
comportamentos discriminatórios são frutos de um preconceito embutido em nossa
cultura eurocêntrica, dominadora e opressora, com os quais convivemos e
acumulamos desde criancinha, através da educação escolar e da grande mídia
empresarial. Contraditoriamente, as escolas governamental e empresarial, em boa
parte, ainda se negam a ensinar a história da formação do povo brasileiro
segundo a visão das matrizes negra e indígena, tratando-os como selvagens
(próximos aos animais irracionais) e incapazes.
O foco da formação do
Brasil ainda é o descobrimento de uma nova terra que precisava se evangelizar e
ser explorada economicamente, ignorando de forma criminosa que esta terra já
tinha habitantes – e muitos – e que foram assassinados, violentados,
estuprados, escravizados, evangelizados e explorados. A diversidade de povos
existentes, de religiões e de línguas era muito grande, bem como suas
populações eram numerosas: carijós, guaranis, tupiniquins, tupinambás,
potiguaras, tabajaras, caetés, tamoios, caiapós, entre tantos outros. Hoje,
pouco resta desta diversidade. Mas resta.
Portanto, quando alguém
se refere aos indígenas como sendo “uma outra gente”, certamente ignora (ou
finge que ignora) que a gente é indígena, a gente é negro, a gente é branco, já
que na nossa cultura e na nossa genética temos um pouco de cada, formando esta
nova etnia: a brasileira. Discriminar os nossos antepassados é como espancar
nossas bisavós, uma tremenda covardia.
Infelizmente, os dados
censitários do IBGE demonstram o extermínio e o preconceito presentes na nossa
sociedade, já que pela auto-declaração, poucos se consideram indígenas, muitas
vezes assinalando “pardos”, buscando fugir do preconceito declarado de boa
parte da população. Esta discriminação está presente nos mais diversos espaços
públicos, por exemplo, nas escolas, quando alunos e professores, em sua
maioria, consideram o “ser índio” uma coisa menor, selvagem. Chamar alguém de
índio, infelizmente, é um xingamento em muitos lugares.
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